
Hoje é Dia da Mãe. E continuamos a puni-las por existirem.
Há uma ideia insidiosa, silenciosa e teimosa que ainda atravessa demasiadas empresas: a ideia de que a maternidade é um problema para a produtividade. Um risco. Um obstáculo. Uma perda de eficiência.
Como se gerar, parir e cuidar de um ser humano tornasse uma mulher menos capaz de pensar, liderar ou entregar resultados.
Como se a inteligência que gere horários escolares, cadernos por assinar, refeições improvisadas e noites mal dormidas não fosse exactamente a mesma que gere equipas, projectos e decisões estratégicas.
As mães trabalham mais.
As mães trabalham melhor.
As mães fazem mais em menos tempo — não por milagre, mas por necessidade.
Há estudos. Muitos. E não são recentes.
Um relatório do Federal Reserve Bank of St. Louis analisou mais de 10 mil economistas e concluiu que as mulheres com filhos superavam consistentemente as suas colegas sem filhos em produtividade científica — especialmente as que tinham dois ou mais filhos.
Outros estudos mostram que mães desenvolvem maior capacidade de gestão do tempo, foco e organização. Trabalham com mais intensidade e menos desperdício. E, ironicamente, são penalizadas por isso.
Chama-se penalização da maternidade.
E é real.
Enquanto os homens recebem um “bónus da paternidade” (tendência a serem promovidos ou aumentados por se tornarem pais), as mulheres com filhos são vistas como menos comprometidas, menos disponíveis, menos aptas para cargos de liderança.
Mesmo quando provam o contrário todos os dias.
A mulher que sai 5 minutos mais cedo para buscar um filho é olhada de lado.
O homem que faz o mesmo é aplaudido por ser “pai presente”.
Ela é um risco.
Ele é um herói.
No consultório, vejo mães exaustas. A tentarem compensar por todos os lados.
Na empresa. Em casa. Na escola. No corpo.
Vejo culpa onde devia haver orgulho.
Vejo medo de assumir fragilidade.
Vejo silêncio. Porque muitas aprenderam que ser mãe no mundo do trabalho é melhor calar.
E no entanto, é pela voz que começa a mudança.
Este Dia da Mãe, não quero flores.
Quero políticas justas.
Quero horários flexíveis. Equipas solidárias. Licenças partilhadas. Empregadores que compreendam que cuidar também é competência.
Quero que o talento não seja descartado ao primeiro teste de gravidez.
Quero que a produtividade não se meça pela permanência no escritório, mas pelo valor real do que é feito.
Quero que as mães deixem de ser tratadas como problema.
E passem a ser reconhecidas como o que são: profissionais resilientes, multifuncionais, estratégicas — e humanas.
Nem todas as mulheres são mães.
Mas todas as mães que conheço aprenderam a trabalhar com interrupções, prioridades em conflito, exigências emocionais e físicas a qualquer hora.
Aprenderam a improvisar. A liderar em condições adversas. A encontrar soluções com recursos mínimos.
Aprenderam a cair e a levantar-se com uma criança ao colo.
E ainda assim, no fim do dia, muitas sentem que não foi suficiente.
Porque a sociedade exige perfeição às mães.
Produtividade sem quebras.
Disponibilidade sem limites.
Cuidado sem reconhecimento.
Este artigo é para ti, mãe que trabalhas.
Que alimentas um bebé às 3h da manhã e entras numa reunião às 9h com um sorriso treinado.
Que aguentas olhares, insinuações e expectativas irreais.
Que aprendes a caber em espaços que não foram feitos para ti.
Não estás sozinha.
E não és menos.
És mais.
Porque continuas.
Porque entregas.
Porque resistes.
Porque trabalhas com alma.
Neste Dia da Mãe, que não seja só o bolo e a flor.
Que seja também o reconhecimento daquilo que precisa de mudar.
Porque mães não atrasam nada.
O que atrasa — e já devia ter ficado para trás — é a cultura que continua a puni-las por existir.
Feliz Dia da Mãe.
Às que criam.
Às que cuidam.
Às que não desistem.
E às que sabem que o trabalho mais importante nem sempre tem crachá.
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